PEDALADAS FISCAIS - A RELAÇÃO COM AS CONTAS DE GOVERNO DA REPÚBLICA DE 2014 - TEXTO 002A



PEDALADAS FISCAIS – PEDALADAS FISCAIS E AS CONTAS DE GOVERNO DE 2014
AUTOR: Antonio Carlos Costa d'Ávila Carvalho Júnior - Professor de Orçamento Público e Gestão Fiscal - professordavila@hotmail.com
OBSERVAÇÃO: permitida a reprodução, desde que citadas a fonte e o autor.

As Contas de Governo da República e o Tribunal de Contas da União
A primeira das competências atribuídas pela Constituição ao Tribunal de Contas da União é a de apreciar e emitir parecer prévio sobre as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República. Verbis:
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento;
Geralmente, as informações (Balanço Geral da União, Relatório do Órgão Central do Sistema de Controle Interno do Poder Executivo etc) necessárias à apreciação das Contas são encaminhadas ao TCU até o mês de abril, o que faz com que, dado o prazo de 60 (sessenta) dias estabelecido pelo texto constitucional, a sessão em que se exara o Parecer Prévio se realiza durante o mês de junho.
No âmbito do TCU, compete à Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag) assessorar o Ministro-Relator na elaboração do Relatório sobre as Contas de Governo da República. Referido trabalho precisa ser realizado, portanto, ao longo do primeiro semestre de cada exercício financeiro. No caso das Contas de Governo referentes ao ano de 2014, cuja relatoria ficou a cargo do Ministro Augusto Nardes, o trabalho de assessoramento foi realizado pela Semag nos primeiros seis meses de 2015.
Os achados do processo das “pedaladas fiscais 2014” são levados às CG2014
Até o início de maio de 2015, o processo das “Pedaladas Fiscais 2014” (TC 021.643/2014-8) foi objeto de duas decisões (unânimes, frise-se) por parte do Plenário do TCU, a saber:
(i) Acórdão 825/2015-TCU-Plenário (15 de abril de 2015); e
(ii) Acórdão992/2015-TCU-Plenário (1º de maio de 2015), quando foram apreciados os embargos de declaração apresentados ao Acórdão 825/2015-TCU-Plenário.
Com o assessoramento da Semag, os achados/constatações de tais Acórdãos foram levados ao corpo do Relatório do Ministro Augusto Nardes no âmbito do processo das Contas de Governo de 2014 (TC 005.335/2015-9), passando a compor uma espécie de lista de “indícios de irregularidades”, os quais, posteriormente, viriam a ser objeto de apresentação de contrarrazões por parte da Ex-Presidente da República. Os indícios relacionados ao processo das “Pedaladas Fiscais de 2014” foram os seguintes:
Inobservância do princípio da legalidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), dos pressupostos do planejamento, da transparência e da gestão fiscal responsável (art. 1º, §1º, da Lei Complementar 101/2000), bem como dos arts. 32, §1º, inciso I, 36, caput, e 38, inciso IV, alínea ‘b’, da Lei Complementar 101/2000, em face de adiantamentos concedidos pela Caixa Econômica Federal à União para cobertura de despesas no âmbito dos programas Bolsa Família, Seguro Desemprego e Abono Salarial no exercício de 2014; (Grifou-se)
Inobservância do princípio da legalidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), dos pressupostos do planejamento, da transparência e da gestão fiscal responsável (art. 1º, §1º, da Lei Complementar 101/2000), bem como do art. 32, §1º, inciso II, da Lei Complementar 101/2000, em face de adiantamentos concedidos pelo FGTS à União para cobertura de despesas no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida no exercício de 2014; (Grifou-se)
Inobservância do princípio da legalidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), dos pressupostos do planejamento, da transparência e da gestão fiscal responsável (art. 1º, §1º, da Lei Complementar 101/2000), bem como dos arts. 32, §1º, incisos I e II, e 36, caput, da Lei Complementar 101/2000, em face de adiantamentos concedidos pelo BNDES à União para cobertura de despesas no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento no exercício de 2014; (Grifou-se)
Inobservância do princípio da legalidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), do princípio orçamentário da universalidade (arts. 3º, caput, da Lei 4.320/1964 e 5º, § 1º, da Lei Complementar 101/2000), dos pressupostos do planejamento, da transparência e da gestão fiscal responsável (art. 1º, §1º, da Lei Complementar 101/2000), bem como dos arts. 167, inciso II, da Constituição Federal e 32, §1º, inciso V, da Lei Complementar 101/2000, em face da execução de despesa com pagamento de dívida contratual junto ao FGTS sem a devida autorização orçamentária no exercício de 2014; (Grifou-se)
Inobservância do princípio da legalidade (art. 37, caput, da Constituição Federal), dos pressupostos do planejamento, da transparência e da gestão fiscal responsável (art. 1º, §1º, da Lei Complementar 101/2000), bem como dos arts. 36, caput, da Lei 4.320/1964, 35 e 67, caput, do Decreto 93.872/1986, em face da inscrição irregular em restos a pagar de R$ 1,367 bilhão referentes a despesas do Programa Minha Casa Minha Vida no exercício de 2014. (Grifou-se)
Curioso observar que entre os indícios de irregularidades listados pelo Ministro Augusto Nardes em seu Relatório Preliminar sobre as Contas de Governo de 2014 não foram incluídas as operações de crédito realizadas entre o Banco do Brasil e a União no âmbito do Plano Safra, embora tais operações tivessem sido objeto do item “9.6.3” do Acórdão 825/2-15-TCU-Plenário, de Relatoria do Ministro José Múcio Monteiro, no âmbito do TC 021.643/2014-8 (Processo das Pedaladas Fiscais de 2014).
A abertura de prazo para apresentação de contrarrazões por parte da Ex-Presidente
Em sessão realizada no dia 17 de junho de 2015, o Ministro Augusto Nardes (Relator das Contas de Governo de 2014) exarou Voto no sentido de que o TCU concedesse prazo de 30 (trinta) dias para que a Ex-Presidente da República se manifestasse em relação às 13 (treze) irregularidades listadas em seu Relatório. Verbis:
Nesses termos, em observância ao princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa, e em respeito ao entendimento do egrégio Supremo Tribunal Federal, proponho ao Tribunal que, preliminarmente à apreciação definitiva das Contas, seja facultado o pronunciamento da Senhora Presidente da República acerca dos indícios de irregularidades apontados no relatório e relacionados em detalhe na minuta de Acórdão que submeto ao Plenário.
A minuta de Acórdão apresentada pelo Ministro Augusto Nardes foi aprovada por unanimidade pelo Pleno do TCU, por intermédio do Acórdão 1464/2015-TCU-Plenário. Os “itens 9.1 e 9.2” foram assim redigidos, in verbis:
9.1. comunicar ao Congresso Nacional que as Contas do Governo referentes ao exercício de 2014, prestadas pela Excelentíssima Senhora Presidente da República Dilma Vana Rousseff, não estão, no momento, em condições de serem apreciadas por este Tribunal, em razão dos indícios de irregularidades mencionados no Relatório, que demandam a abertura de prazo para apresentação de contrarrazões, em nome do devido processo legal e em respeito ao princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa;
9.2. dar ciência desta deliberação à Excelentíssima Senhora Presidente da República, Dilma Vana Rousseff, a fim de que, caso manifeste interesse e entenda necessário, pronuncie-se, no prazo de 30 (trinta) dias, acerca dos seguintes indícios de irregularidades:
As contrarrazões apresentadas pela Ex-Presidente da República
A Ex-Presidente da República, representada pelo então Advogado Geral da União, Luis Inácio Lucena Adams, apresentou suas contrarrazões (arquivo1 e arquivo2ao TCU no dia 22 de julho de 2015. De imediato, o Ministro Augusto Nardes determinou à Semag que efetuasse os exames e análises pertinentes.
Na oportunidade, a convite do Secretário da Semag (Leonardo Rodrigues Albernaz), reintegrei a equipe de auditores dessa secretaria (na qual havia trabalhado entre os anos de 2004 a 2013) e fui responsável pelo exame da maioria das contrarrazões.
A análise da unidade técnica (Semag) sobre as contrarrazões aos indícios de irregularidades apontados pelo Relatório Preliminar sobre a Prestação de Contas da Presidente da República relativa ao exercício de 2014 foi concluída no dia 1º de outubro de 2015.
Logo em seguida, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPjTCU), por intermédio de seu, à época, Procurador-Geral, Paulo Soares Bugarin, também se manifestou a respeito das contrarrazões apresentadas pela Ex-Presidente da República.
Ressalto que este Blog, por intermédio de outras postagens, organizadas por área temática respectiva, discorrerá sobre todas as contrarrazões apresentadas pela Ex-Presidente e sobre as análises/exames empreendidas pela Corte de Contas.
Parecer Prévio Conclusivo sobre as Contas de Governo da República de 2014
Em sessão realizada no dia 07 de outubro de 2015, o Plenário do TCU, com base em Voto de lavra do Ministro-Relator Augusto Nardes, mediante Acórdão 2461/2015-TCU-Plenário, aprovou, por unanimidade, o ParecerPrévio sobre as Contas de Governo referente ao exercício de 2014, nos seguintes termos, in verbis:
O Tribunal de Contas da União é de parecer que as Contas atinentes ao exercício financeiro de 2014, apresentadas pela Excelentíssima Senhora Presidente da República, Dilma Vana Rousseff, exceto pelos possíveis efeitos dos achados de auditoria referentes às demonstrações contábeis da União, consignados no relatório, representam adequadamente as posições financeira, orçamentária, contábil e patrimonial, em 31 de dezembro de 2014; contudo, devido à relevância dos efeitos das irregularidades relacionadas à execução dos orçamentos, não elididas pelas contrarrazões apresentadas por Sua Excelência, não houve observância plena aos princípios constitucionais e legais que regem a administração pública federal, às normas constitucionais, legais e regulamentares na execução dos orçamentos da União e nas demais operações realizadas com recursos públicos federais, conforme estabelece a lei orçamentária anual, razão pela qual as Contas não estão em condições de serem aprovadas, recomendando-se a sua rejeição pelo Congresso Nacional. (Grifou-se)
FIM

PEDALADAS FISCAIS - QUANDO A INVESTIGAÇÃO COMEÇOU??? - TEXTO 002



PEDALADAS FISCAIS – O INÍCIO DA INVESTIGAÇÃO – DIREITO FINANCEIRO EM TELA
AUTOR: Antonio Carlos Costa d'Ávila Carvalho Júnior - Professor de Orçamento Público e Gestão Fiscal - professordavila@hotmail.com
OBSERVAÇÃO: permitida a reprodução, desde que citadas a fonte e o autor.

A face mais conhecida das “pedaladas fiscais”...
... É aquela em que a União atrasava o repasse de recursos financeiros a bancos públicos com o objetivo de evidenciar uma situação fiscal melhor do que a real.
O Jornal “O Estado de São Paulo”, em texto dos jornalistas João Villaverde e Adriana Fernandes, tem publicado na rede mundial de computadores um “infográfico” muito didático sobre tais operações. Nele, os jornalistas informam o seguinte:
A "pedalada fiscal" foi o nome dado à prática do Tesouro Nacional de atrasar de forma proposital o repasse de dinheiro para bancos (públicos e também privados) e autarquias, como o INSS. O objetivo do Tesouro e do Ministério da Fazenda era melhorar artificialmente as contas federais. Ao deixar de transferir o dinheiro, o governo apresentava todos os meses despesas menores do que elas deveriam ser na prática e, assim, ludibriava o mercado financeiro e especialistas em contas públicas.
Para investigar tais atrasos, em 21 de agosto de 2014, o Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPjTCU), Júlio Marcelo de Oliveira, redigiu Representação (a qual anexou diversas reportagens e matérias jornalísticas) por intermédio da qual requereu ao Ministro José Múcio Monteiro a realização de inspeção no Banco Central do Brasil e no Tesouro Nacional, órgãos que integram a lista de unidades jurisdicionadas da Secretaria de Controle Externo da Fazenda Nacional do TCU (Secex Fazenda).
No dia 25 de agosto de 2014, por intermédio de despacho, o Ministro José Múcio determinou a autuação da representação e a manifestação da Secex Fazenda em relação ao pedido formulado pelo Procurador Júlio Marcelo de Oliveira.
A representação foi autuada com o número TC 021.643/2014-8, e a manifestação (Auditor, Diretor e Secretário) da Secex Fazenda, que concordou com proposta feita pelo Procurador, foi concluída entre os dias 10 e 12 de setembro de 2014. A realização da inspeção foi definitivamente autorizada pelo Ministro José Múcio Monteiro em 15 de setembro do mesmo ano.
O que poucos sabem, no entanto, é que a investigação das “pedaladas fiscais” não teve início com referido processo.
O INÍCIO da investigação das “pedaladas fiscais”
Em 09 de junho de 2014, elaborei Representação e a encaminhei ao então Secretário de Controle Externo da Fazenda Nacional, por intermédio da qual solicitei autorização da Corte de Contas para a realização de diligências junto à Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e ao Ministério da Educação (MEC) com o objetivo coletar informações sobre:
(i) atrasos no repasse a Estados e Municípios de recursos de royalties do petróleo, de compensações financeiras pelo uso de recursos hídricos e do salário educação; e
(ii) os efeitos de tais atrasos sobre o cálculo do resultado fiscal (estatísticas fiscais) efetuado pelo Banco Central do Brasil.
No dia 28 de julho de 2014, o Ministro José Múcio Monteiro conheceu da representação e autorizou a realização das diligências propostas. O processo respectivo foi autuado com o nº TC 015.891/2014-3.
Posteriormente, em face da semelhança de objetos, elaborei instrução propondo ao Ministro-Relator o apensamento do TC 015.891/2014-3 (atraso no repasse de royalties e FNDE a entes federados) ao TC 021.643/2014-8 (atrasos no repasse de recursos a bancos públicos). O despacho com a autorização foi exarado em 29 de setembro de 2014 e o processo foi apensado no dia subsequente.
Como irão mostrar as próximas postagens, todos os achados e constatações relacionados ao TC 015.891/2014-3 foram relatados em conjunto com aqueles relativos aos objetos do TC 021.643/2014-8, mesmo porque os trabalhos de inspeção foram realizados pela mesma equipe.

Você também pode entender como toda a investigação teve início, assistindo ao vídeo abaixo. Aproveite!


FIM

PEDALADAS FISCAIS - ESTATÍSTICAS FISCAIS - VISÃO GERAL - TEXTO 001



PEDALADAS FISCAIS – ESTATÍSTICAS FISCAIS – DIREITO FINANCEIRO EM TELA
AUTOR: Antonio Carlos Costa d'Ávila Carvalho Júnior - Professor de Orçamento Público e Gestão Fiscal - professordavila@hotmail.com
OBSERVAÇÃO: permitida a reprodução, desde que citadas a fonte e o autor.

As “estatísticas fiscais” apuradas pelo BCB e as metas fiscais da LDO
Metas de resultado fiscal são estabelecidas com o propósito de se controlar a variação do endividamento do respectivo ente federado. Superávits reduzem endividamento e déficits aumentam o endividamento.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) determina que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de cada ente conterá Anexo de Metas Fiscais no qual serão estabelecidas metas para o resultado fiscal primário e nominal e para a dívida pública.
Diversos trabalhos do TCU já deixaram evidenciado que ainda não foi aprovada pelo Senado Federal, como determina a LRF, a metodologia de cálculo do resultado primário e nominal.
Em razão disso, na União, as LDOs têm determinado que a Mensagem que encaminhar o PLOA ao Congresso Nacional estabelecerá o órgão e o método utilizado para verificar o cumprimento das metas fiscais.
O Banco Central do Brasil (Bacen) tem sido o órgão indicado para tal finalidade, utilizando a metodologia “abaixo da linha” que calcula o resultado fiscal a partir da variação da Dívida Líquida do Setor Público (DLSP).
Compete aos Tribunais de Contas, de acordo com a LRF (art. 59, I), verificar o atingimento das metas estabelecidas pela LDO.  
Pois bem. Para que pudesse exercer tal atribuição, o TCU, por intermédio do Acórdão 0324/2006-TCU-Plenário (TC 014.263/2005-4), determinou ao BCB a edição de Manual que evidenciasse os principais aspectos, conceitos e regras utilizados para a apuração do resultado fiscal pelo método “abaixo da linha”. A determinação foi lavrada nos seguintes termos, in verbis:
2. Determinar: (...)
2.2 ao Banco Central do Brasil a fim de que o Tribunal de Contas da União possa desempenhar, em sua plenitude, as funções que lhe foram atribuídas pela Constituição Federal e pelo artigo 59 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que:
2.2.1 em até 90 dias, elabore e publique, inclusive em meios eletrônicos de divulgação, Manual que evidencie os conceitos, as formas de cálculo e os procedimentos utilizados pela metodologia "Abaixo da Linha" para a apuração das Necessidades de Financiamento do Setor Público e da Dívida Líquida do Setor Público, a fim de que o Tribunal de Contas da União possa desempenhar, em sua plenitude, as funções que lhe foram atribuídas pela Constituição Federal e pelo artigo 59 da Lei de Responsabilidade Fiscal; (Grifou- se)
A relação entre as “pedaladas fiscais” e as “estatísticas fiscais”
As “pedaladas fiscais” representaram atrasos no pagamento de despesas de responsabilidade da União com o objetivo de postergar o registro de despesas primárias pelas estatísticas fiscais.
Alguns desses atrasos foram eventuais, sem a omissão de passivos nas estatísticas fiscais e sem a caracterização de operação de crédito. Outros, no entanto, foram sucessivos, vultosos, com o não registro de passivos nas estatísticas fiscais e com a caracterização de operação de crédito (algumas vedadas por lei).
Já que:
          (i) o resultado fiscal é calculado a partir da variação do saldo da dívida líquida entre dois instantes;
          (ii) a dívida líquida é a diferença entre obrigações e haveres; e
          (iii) despesa é a operação que aumenta o saldo da dívida líquida.
Então, para se evitar o registro de uma despesa nas estatísticas fiscais, é preciso evitar o registro de reduções no saldo de haveres e/ou de aumentos no saldo de obrigações. Procura-se evitar o registro:
(i) da redução do saldo de haveres quando se posterga o pagamento de obrigações;
(ii) do aumento do saldo de obrigações quando não se registra uma dívida nas estatísticas fiscais; e
(iii) da redução do saldo de haveres e do aumento do saldo de obrigações quando, ao mesmo tempo, posterga-se o pagamento de uma obrigação e deixa-se de registrar a dívida respectiva nas estatísticas fiscais.
Exemplos...
(i) despesa de pessoal: se o objetivo é evitar o registro da despesa (primária) com pessoal nas estatísticas fiscais, basta atrasar o pagamento da despesa, evitando a redução do saldo da Conta Única do Tesouro;
(ii) seguro desemprego: se o objetivo é evitar o registro de referida despesa (primária) nas estatísticas fiscais, basta atrasar o pagamento da mesma, evitando a redução do saldo da Conta Única do Tesouro. Ocorre que o atraso em tal pagamento poderia acarretar uma situação perversa (pessoas desempregadas ficariam sem tal fonte de renda). Nesse caso, se a despesa respectiva for paga, em nome da União, por um banco federal (Caixa Econômica, por exemplo), a dívida daí surgida precisaria ser registrada pelas estatísticas, dadas as premissas/critérios por ela adotados. Desse modo, a única “maneira” de evitar o registro da despesa seria efetuando o “não registro” da dívida respectiva nas estatísticas fiscais.
Em relação ao tema ora em comento, é possível acessar o Relatório elaborado pelos auditores do TCU no âmbito do TC 021.643/2014-8 (“Pedaladas Fiscais 2014”), a manifestação do Procurador do Ministério Público junto ao TCU (Júlio Marcelo de Oliveira) e o Voto do Ministro-Relator do respectivo processo, Ministro José Múcio Monteiro.
Para ter uma visão geral sobre como o BCB apura o resultado fiscal (primário e nominal) e de como as estatísticas fiscais se relacionam com as “pedaladas fiscais”, veja os vídeos a seguir a respeito do tema.


FIM

PEDALADAS FISCAIS - APRESENTAÇÃO - TEXTO 000



PEDALADAS FISCAIS – PARTE INICIAL – DIREITO FINANCEIRO EM TELA
AUTOR: Antonio Carlos Costa d'Ávila Carvalho Júnior - Professor de Orçamento Público e Gestão Fiscal - professordavila@hotmail.com
OBSERVAÇÃO: permitida a reprodução, desde que citadas a fonte e o autor.

“Pedaladas Fiscais” por completo
As “pedaladas fiscais” são o ato de atrasar o pagamento de obrigações com o objetivo de postergar o registro de despesas pela contabilidade oficial (estatísticas fiscais).
A expressão passou a ser de amplo conhecimento da sociedade brasileira quando uma dessas práticas – atraso no pagamento de obrigações junto ao Banco do Brasil no âmbito do Plano Safra – integrou a Denúncia de crime de responsabilidade contra a ex-Presidente da República.
As “pedaladas fiscais”, é bom ressaltar, envolveram outras operações. No entanto, como essas “outras operações” foram realizadas antes do início do ano de 2015, acabaram ficando de fora do processo de impeachment, sob o argumento de que o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções (Constituição da República, art. 86, § 4º), fazendo com que muito pouco (ou quase nada) se discutisse sobre elas: características, operacionalização, enquadramento, montantes etc.
Como Auditor Federal de Controle Externo do Tribunal de Conta da União, onde trabalhei entre os anos de 2004 a 2016, tive a oportunidade de ser o coordenador da auditoria que constatou a realização das “pedaladas fiscais” no ano de 2014.
Em 2015, ainda no TCU, participei da equipe que analisou as “contrarrazões” apresentadas pela ex-Presidente no âmbito do processo das Contas de Governo da República relativas ao exercício financeiro de 2014, as quais, posteriormente, receberam Parecer Prévio do TCU pela sua rejeição.
Em 2016, em função dessa experiência – imagino – fui arrolado como testemunha no processo de impeachment, sendo convocado a prestar depoimento na Comissão Especial do Impeachment (CEI) do Senado Federal (no dia 08 de junho de 2016) e na sessão de julgamento ocorrida no Plenário do Senado (no dia 25 de agosto de 2016).
Pois bem. Toda essa vivência me estimula e me obriga a compartilhar com a sociedade – e este é o principal objetivo deste “blog” – todo o conhecimento técnico que, juntamente com outros colegas auditores, tive o privilégio de produzir quando da realização dos citados trabalhos de auditoria e análise de contas.
Esta é, portanto, a primeira de uma série de postagens que terão por objetivo apresentar o universo das “pedaladas fiscais”, tentando responder questões que, a meu ver, ainda carecem de uma resposta mais completa, por exemplo:
(i) quais foram as operações enquadradas como “pedaladas fiscais”?
(ii) as “pedaladas fiscais” foram praticadas por outros governos?
(iii) as investigações das “pedaladas fiscais” iniciaram antes mesmo da representação apresentada pelo Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, Júlio Marcelo de Oliveira?
(iv) qual a relação das auditorias/processos realizados pelo TCU em 2014 e em 2015 com o processo de impeachment?
(v) existem documentos que comprovam a realização das “pedaladas fiscais”?
(vi) onde estariam armazenadas tais informações?
Para tanto, reuni diversos documentos (relatórios de auditores, instruções do Ministério Público de Contas, votos de Ministros do TCU, peças processuais etc) relacionados às “pedaladas fiscais” e os organizei por assunto, possibilitando/facilitando o acesso direto ao conjunto de informações necessárias ao entendimento técnico de cada tipo de “pedalada fiscal”.
Bom que se diga que todas as informações aqui apresentadas são de acesso público e podem ser encontradas, com certa facilidade, na rede mundial de computadores.
Na medida do possível, as postagens seguirão a seguinte sequência:
(i) “pedaladas fiscais” e as “estatísticas fiscais”: aspectos básicos.
(ii) o início das investigações das “pedaladas fiscais” em 2014.
(iii) os atrasos no repasse de royalties, compensações financeiras e salário educação aos entes federados.
(iv) a utilização de bancos federais para o pagamento de despesas de responsabilidade da União: Programa Minha Casa Minha Vida.
(v) a utilização de bancos federais para o pagamento de despesas de responsabilidade da União: bolsa família, seguro desemprego e abono salarial.
(vi) atraso no pagamento, ao BNDES, de equalizações de taxas de juros no âmbito do Programa de Sustentação do Investimento (PSI).
(vii) atraso no pagamento, ao Banco do Brasil, de equalizações de taxas de juros no âmbito do Plano Safra.
(viii) as pedaladas fiscais e seu relacionamento com as estatísticas fiscais.
O conteúdo de cada grupo de postagens estará organizado do seguinte modo:
(i) texto resumido com indicação dos aspectos mais relevantes.
(ii) link para texto que reúne, de forma organizada/apartada, as partes dos pronunciamentos (relatórios, instruções, votos, análises de contrarrazões, conclusões etc) que tenham sido elaborados por auditores, procuradores, Ministros do TCU etc e que tenham relação direta com a temática.
(iii) link para a versão integral (sem cortes) dos documentos (relatórios, votos, instruções etc) dos quais tenham sido extraídos os excertos citados pelo item acima.
(iv) links para peças e documentos que integram os processos e que serviram de base para as constatações, conclusões, decisões etc.
(v) vídeos (apresentação em powerpoint) que apresentarão, com a maior didática possível, os aspectos conceituais referentes a cada tipo de “pedalada fiscal”.
Espero, desse modo, reunir, em um só lugar, de maneira didática, as informações técnicas a respeito de um dos temas mais relevantes de nossa história recente.
Aproveite a oportunidade e veja o primeiro vídeo/apresentação a respeito do tema.
Que seja bastante útil!!!

FIM

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