AUTOR: Antonio Carlos Costa d'Ávila Carvalho Júnior - Professor de Orçamento Público e Gestão Fiscal -
professordavila@hotmail.com
OBSERVAÇÃO: permitida a reprodução, desde que citados a fonte e o autor.
Jornais
de grande circulação noticiam que União e Petrobrás estão caminhando para o final
das negociações envolvendo a revisão do contrato de cessão onerosa ocorrida em
2010. Ao que parece, haverá um montante a ser pago pela União à Petrobrás.
Jornais
também têm dito que a tendência é que tal “provável pagamento da União à
Petrobras” ocorra em barris de petróleo a serem explorados. Informam também que
o governo já analisou outras hipóteses de pagamento, a saber: pagar em dinheiro ou
em emissão de títulos.
O
presente texto procura mostrar os impactos advindos de cada uma
dessas hipóteses de pagamento (em dinheiro; em títulos públicos; e em barris de
petróleo) sobre o orçamento, sobre as estatísticas fiscais, sobre o “teto de
gastos” e sobre a “regra de ouro”.
a) orçamentários:
se haverá necessidade de se obter autorização via processo legislativo
orçamentário, mediante aprovação de crédito adicional.
b)
fiscais: quais serão as variações na Dívida Líquida e Bruta do Setor Público,
bem como o impacto sobre o resultado primário da União e das estatais.
c) no
teto de gastos: verificar se o pagamento da despesa acarretará, ou não, aumento
das despesas primárias sujeitas ao teto de gastos estabelecido pela Emenda
Constitucional nº 95/2016.
d) na
regra de ouro: mensurar se o reconhecimento e o pagamento da dívida terá alguma influência nos montantes das operações de crédito e no das despesas de
capital.
DESPESA OBJETO DE PAGAMENTO PELA UNIÃO
A
primeira análise que precisa ser feita é o enquadramento da despesa a ser
objeto de pagamento.
Ao que
parece, a União reconhece que o valor cobrado da Petrobrás pela cessão onerosa
ocorrida em 2010 foi maior do que deveria, uma vez que houve uma queda no preço
do barril do petróleo ao longo do tempo. Nesse caso, ocorrerá o
reconhecimento de um passivo junto à Petrobrás.
Sob o
ponto de vista orçamentário, a amortização de uma dívida representa uma despesa
de capital.
PAGAMENTO EM DINHEIRO
A opção
pelo pagamento em dinheiro traz implícito que tais recursos (dinheiro) já foram
arrecadados anteriormente (exercício atual ou exercícios anteriores). Ou seja,
estão depositados na Conta Única do Tesouro Nacional.
Os
impactos seriam os seguintes:
a) orçamentários: haverá uma despesa
orçamentária de capital (amortização da dívida) e a utilização de receita
orçamentária já arrecadada anteriormente (fonte a ser definida). Será necessário autorizar a despesa no orçamento, por intermédio da aprovação de
crédito adicional especial.
b) fiscais: a Petrobrás não integra as
estatísticas fiscais desde o ano de 2008. Nesse sentido, importa mensurar
apenas os impactos sobre os haveres e obrigações do governo federal. Como dito
acima, os recursos a serem utilizados no pagamento já estão depositados na
Conta Única do TN no Bacen. Desse modo, já são captados atualmente
pelas estatísticas fiscais. De outro lado, a dívida que virá a ser reconhecida pela
União não está (por razões metodológicas da apuração “abaixo da
linha”) registrada pelo Bacen nas estatísticas fiscais. Assim, o impacto será o
seguinte: (i) aumento da Dívida Líquida do Governo Federal, em razão da redução
do saldo das disponibilidades na Conta Única; (ii) nenhum impacto na Dívida
Bruta do Governo Geral, uma vez que não haverá redução do saldo de obrigações
(já que a dívida não é registrada pelas estatísticas fiscais); (iii) despesa
primária, em razão da variação primária deficitária (variação que não decorre
da apropriação de juros) que ocorrerá no saldo da Conta Única do TN.
c) teto de gastos: para fins de mensuração
do “teto de gastos”, registra-se a despesa primária quando da emissão da Ordem
Bancária (OB). Desse modo, o pagamento em dinheiro, que demanda a emissão de
OB, terá impacto sobre o teto de gastos.
d) regra de ouro: de todo modo, como o
pagamento da dívida representa uma despesa orçamentária de capital, então, no
limite, a realização da despesa não impactará negativamente o cumprimento da “regra
de ouro”. Para mensurar adequadamente, é preciso verificar a natureza da
receita a ser utilizada para o pagamento da mesma. Se for recurso oriundo de
operações de crédito, então o impacto sobre a “regra de ouro” será neutro; mas
se o recurso for de outra natureza, então a amortização da dívida contribuirá para o cumprimento da “regra de ouro”.
PAGAMENTO COM EMISSÃO DIRETA DE TÍTULOS
Se o
pagamento do passivo vier a ser efetuado com a emissão direta de títulos
públicos à Petrobrás, então a operação representará a amortização de uma dívida
mediante assunção de uma nova dívida (títulos públicos). De acordo com o art.
29, III, da Lei de Responsabilidade Fiscal, a emissão do título público para
pagamento da dívida será uma espécie de operação de crédito. In verbis:
III - operação de crédito: compromisso financeiro assumido em razão de
mútuo, abertura de crédito, emissão
e aceite de título, aquisição
financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a
termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos
financeiros;” (Grifou-se)
Uma vez
que se enquadra como operação de crédito, a emissão direta dos títulos públicos
precisará ser autorizada pelo Poder Legislativo. Tal autorização pode ser
obtida, em regra, mediante processo legislativo ordinário ou, excepcionalmente,
por intermédio do processo legislativo orçamentário, desde que, neste caso,
inserida em projeto de lei de crédito adicional.
Quanto
aos impactos, seriam os seguintes:
a) orçamentários: como dito acima, a
emissão direta de um título é uma operação de crédito. Ou seja, representa a
obtenção de uma fonte de recursos para o financiamento de uma despesa
orçamentária, daí sua condição de receita orçamentária. A única diferença que se
poderia apresentar entre efetuar o pagamento da dívida mediante a “emissão
direta de títulos” e mediante a utilização de “dinheiro guardado em
disponibilidades” seria o momento em que ocorre a arrecadação da respectiva
fonte de recursos (receita orçamentária). No caso do pagamento em dinheiro, os
recursos são arrecadados em momento anterior ao da realização da despesa
orçamentária, enquanto que, no caso da emissão direta de títulos, os recursos
são arrecadados (Petrobrás financia a União ao aceitar os títulos) no mesmo
instante em que se realiza a despesa orçamentária de capital (pagamento da
dívida junto à Petrobrás). Desse modo, forçoso concluir no sentido de que será necessário inserir no orçamento, mediante aprovação de crédito adicional, a
despesa orçamentária de capital (amortização da dívida) e a respectiva fonte de
recursos (receita orçamentária de capital com operação de crédito).
b) fiscais: como dito acima, a Petrobrás
não integra as estatísticas fiscais desde o ano de 2008. Nesse sentido, importa
mensurar apenas os impactos sobre os haveres e obrigações do governo federal. O
pagamento da dívida mediante emissão direta de títulos públicos produzirá aumento da Dívida Líquida do Governo Federal, em razão do aumento do saldo do passivo
“dívida mobiliária federal interna” e da “não redução” de qualquer outra
obrigação, uma vez que, como cediço, a dívida a ser reconhecida pela União não
está (por razões metodológicas da apuração “abaixo da linha”)
registrada pelo Bacen nas estatísticas fiscais. Assim, o impacto será o
seguinte: (i) aumento da Dívida Líquida do Governo Federal, em razão do aumento
da “dívida mobiliária federal interna”; (ii) aumento na Dívida Bruta do Governo
Geral, pelos mesmos motivos acima apresentados; e (iii) despesa primária, em
razão da variação primária deficitária (variação que não decorre da apropriação
de juros) que ocorrerá no saldo do item “dívida mobiliária federal interna”
registrado pelas estatísticas fiscais.
c) teto de gastos: para fins de mensuração
do “teto de gastos”, registra-se a despesa primária quando da emissão da Ordem
Bancária (OB). Desse modo, como não haverá emissão de OB, posto que o pagamento
será efetuado com a emissão direta de títulos públicos, não haverá impacto
sobre o teto de gastos.
d) regra de ouro: como a despesa a ser
realizada é uma despesa de capital e a receita que irá financiar o pagamento será uma operação de crédito, então o impacto sobre a “regra de ouro” será neutro.
PAGAMENTO COM BARRIS DE PETRÓLEO
Efetuar
o pagamento da dívida junto à Petrobrás com “barril de petróleo” significa
dizer que o pagamento será efetuado mediante cessão, à estatal, do direito de
pesquisa e lavra de determinada quantidade de barris em áreas ainda disponíveis
na região do Pré-Sal. Ou seja, em vez de entregar disponibilidades guardadas na
Conta Única ou de emitir um passivo, o pagamento será realizado com a cessão
onerosa do direito de exploração de certa quantidade de petróleo, gás e outros
hidrocarbonetos.
Sob o
ponto de vista orçamentário, os recursos que a União obtém por intermédio da
realização de cessões onerosas de direitos de exploração são conceitualmente
enquadrados como receitas orçamentárias correntes.
Nesse
sentido, é possível avaliar os impactos decorrentes da utilização de tais
recursos para o pagamento de dívida junto à Petrobrás.
a) orçamentários: a cessão onerosa é uma
receita orçamentária corrente e o pagamento da dívida é uma despesa
orçamentária de capital. Do mesmo modo que na emissão direta de títulos, os
recursos oriundos da realização da cessão onerosa à Petrobrás serão obtidos no
mesmo instante em que se efetuar o pagamento da dívida, o que lhes dá o
atributo de “fonte de recursos para o financiamento de uma despesa orçamentária”,
permitindo que sejam enquadrados como receitas orçamentárias. Assim, necessário
concluir no sentido de que será necessário inserir no orçamento, mediante aprovação
de crédito adicional, a despesa orçamentária de capital (amortização da dívida)
e a respectiva fonte de recursos (receita orçamentária corrente – cessão de
direitos de exploração).
b) fiscais: como dito acima, a Petrobrás
não integra as estatísticas fiscais desde o ano de 2008. Nesse sentido, importa
mensurar apenas os impactos sobre os haveres e obrigações do governo federal. O
pagamento da dívida mediante cessão onerosa de direitos de pesquisa e lavra não
produzirá variação nos estoques da Dívida Líquida do Governo Federal e na
Dívida Bruta do Governo Geral, uma vez que nenhum item que integra as
estatísticas fiscais apuradas pelo Banco Central será afetado. Assim, o impacto
será o seguinte: (i) nenhuma variação no saldo da Dívida Líquida do Governo
Federal; (ii) nenhuma variação no saldo da Dívida Bruta do Governo Geral; e (iii)
impacto primário neutro. Na realidade, a operação envolveria uma receita
primária (cessão onerosa) e uma despesa primária (pagamento da dívida),
resultando no impacto primário neutro.
c) teto de gastos: para fins de mensuração
do “teto de gastos”, registra-se a despesa primária quando da emissão da Ordem
Bancária (OB). Desse modo, como não haverá emissão de OB, posto que o pagamento
será efetuado com a cessão onerosa, não haverá impacto sobre o teto de gastos.
d) regra de ouro: como a despesa a ser
realizada é uma despesa de capital e a receita que irá financiar o pagamento é
uma receita corrente, então a operação ampliará o espaço para o cumprimento da “regra
de ouro”.
MINHA OPINIÃO
Se for
para apostar, creio que a operação será realizada mediante pagamento da dívida
com mais uma cessão onerosa à Petrobrás.
FIM